“A grande causa do trabalho infantil é a miséria, é a desproteção do
Estado, que está refletida nos números. Somente entre 2013 e 2014 houve
um aumento de 140% no número de crianças e adolescentes trabalhando”,
declarou o procurador do Trabalho Eduardo Varandas. Os dados, segundo
ele, são da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad)
divulgada pelo Instituto Brasileiro de
Geografia Estatística (IBGE).
Face a esses dados alarmantes, ele revela que tomará providências,
enquanto órgão fiscalizador, para realizar parcerias e cobrar ainda mais
efetividade dos órgãos públicos. Atualmente há 70.285 crianças
trabalhando na faixa etária dos 4 aos 14 anos. Anteriormente eram 29.285
crianças nessa situação.
Esse aumento ao qual o procurador se referiu diz respeito às crianças
que se encontram na faixa etária dos 5 aos 14 anos. Em números, isso
representa 41 mil crianças e adolescentes a mais trabalhando. Como causa
de um aumento tão significativo, o procurador destacou a crise pela
qual o país se encontra que, aliada à diminuição dos programas
assistenciais, reflete nesse significativo aumento.
“Nós vínhamos, nos últimos 10 anos, vivendo reduções anuais. Já não
víamos tantas crianças nos semáforos, nas feiras livres, o governo
federal tinha como meta até 2015 para erradicar o trabalho infantil, mas
não conseguiu. Se numa época de razoável prosperidade econômica não
conseguimos, imagine agora que, devido à necessidade de redução dos
custos, estão diminuindo as verbas assistenciais”, ponderou.
Se considerada uma faixa etária mais abrangente, dos 5 aos 17 anos,
houve ainda um aumento de 65% na quantidade de crianças trabalhando,
indo de 63 mil em 2013 para 104 mil em 2014. Com esses números a Paraíba
ficou em segundo lugar dentre os Estados que tiveram maior avanço na
quantidade de crianças trabalhando. O primeiro lugar é ocupado pelo
Acre, que teve um aumento de 68,7% no número de crianças e adolescentes
nessa situação.
“E esses números não são os atuais, que eu temo que sejam ainda
maiores porque essa é uma pesquisa por amostragem, que não tem acesso a
zonas rurais, ao trabalho doméstico, a crianças vítimas de exploração
sexual. Esse aumento é alarmante, sobretudo às crianças de 4 a 14 anos,
que é justamente o estágio de maior vulnerabilidade, o que mostra que
estamos desprotegendo as crianças na fase de formação, retirando-as da
escola para o trabalho”, comentou.
A meta, que antes era de 2015, para erradicação do trabalho infantil
no país foi postergada para 2020 e, mais uma vez, esse problema vai
sendo empurrado para frente, o que, para Varandas, é reflexo de um
desinteresse social pela questão. “Não é só uma questão de administração
pública, é preciso também um compromisso social. Temos formalmente uma
estrutura numerosa de órgãos de proteção da criança e do adolescente,
mas falta sentimento cívico. Você já viu algum manifesto pela
desproteção de crianças e adolescentes?”, indagou.
REDUÇÃO DO PETI
REDUÇÃO DO PETI
O procurador Eduardo Varandas ainda denunciou uma diminuição dos
recursos direcionados à rede de assistência de erradicação do trabalho
infantil no Estado e no país. “Nós temos acesso a dados de outros
Estados e o que temos visto são coordenadores de Programa de Erradicação
do Trabalho Infantil (Peti) pedindo socorro ao MP por ausência de meios
para realização de ações. Contra fatos, não há argumentos. As políticas
dos municípios são amadoras, insuficientes, muitas vezes pessoas
despreparadas ocupam cargos importantes, a conveniência política
prevalece sobre a efetividade dos órgãos e isso se elastece para o
Estado”, denunciou. “Chegamos a receber informações de que apenas 14
cidades da Paraíba tinham o Peti atualmente”, acrescentou.
“Há quem diga que é melhor estar trabalhando que na rua. E essas são
as únicas opções para crianças pobres? Querem reduzir a maioridade
penal, então tem cadeia para crianças, mas não tem escola? Nossa função é
denunciar à Justiça e coibir. Quem tem a prerrogativa de gerir as
políticas públicas é o Poder Executivo. Dentro dessa estrutura pública
que lamentavelmente é deficiente, faremos parcerias e tentaremos
procurar soluções, mas é preciso que haja compromisso efetivo dos órgãos
públicos, mas nem sempre há”, completou.
O que diz o Estado
De acordo com a secretária de Desenvolvimento Humano do governo do
Estado, Cida Ramos, não houve redução do Peti no Estado. Ela explicou
que o Peti faz parte dos serviços de convivência e vínculo familiar,
parte da política nacional de assistência social, passando a não mais
apenas ocupar o horário das crianças oposto ao da escola, mas incluindo a
família nesse processo. “Essa passou a ser uma questão de unificação de
várias políticas. Educação, juventude, esporte, isso está presente em
todos os municípios. Porque se não se envolver todos os aspectos e
colocar a família no meio, que é uma questão central, não há efetividade
nas ações”, afirmou.
Segundo Cida Ramos, a informação de que o Peti funciona em apenas 14
municípios é inverídica. Ela revelou que o número repassado pelo IBGE é
de que em 19 municípios, dentre os quais está São Bento, Santa Rita e
João Pessoa, há uma maior incidência de trabalho infantil. Por esse
motivo, esses têm sido locais em que as ações estão sendo mais efetivas,
com acompanhamento mais direto.
OTHACYA LOPES/JP
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